A medicina e, em especial, a neurocirurgia andam de mãos dadas com o desenvolvimento tecnológico. Hoje em dia, dispomos de uma infinidade de equipamentos de última geração para a realização de cirurgias cerebrais e da coluna vertebral com a máxima segurança. Nos últimos anos, houve enorme avanço tanto dos métodos de diagnóstico como também de cirurgia para a Doença de Parkinson e demais distúrbios do movimento, tais como o Tremor Essencial e as diversas formas de distonia. Este post discute brevemente dois estudos desenvolvidos no King’s College de Londres que mostram a importância da participação do paciente na decisão sobre qual o melhor tratamento para sua realidade.

Estimulação cerebral profunda
A estimulação cerebral profunda, também chamada DBS (do inglês, deep brain stimulation) consiste em uma cirurgia para o implante de um eletrodo em regiões específicas do cérebro, visando o reestabelecimento da função de determinados circuitos cerebrais responsáveis pela coordenação e execução do movimento. O aparelho se assemelha a um marca-passo cardíaco, porém o eletrodo fica alojado no cérebro e não no coração. Impulsos elétricos emitidos por este marca-passo através de um delicado eletrodo reorganizam a transmissão de informação entre os neurônios (células do sistema nervoso).

Dessa forma, durante os meses que se seguem após a cirurgia, é possível ajustar parâmetros de estimulação no consultório médico, buscando o maior benefício possível, com o mínimo de efeitos adversos. Esta é uma modalidade de tratamento já bem estabelecida, com mais de 30 anos, e que ultimamente vem se tornando cada vez mais acessível no Brasil. Tomando como exemplo a Doença de Parkinson, sintomas como a tremedeira e a lentidão dos movimentos melhoram substancialmente após a cirurgia, devolvendo a qualidade de vida dos pacientes.

Existem diversos tipos e marcas de sistemas para estimulação cerebral profunda no mercado. Geralmente pode-se alcançar bons resultados, independente do modelo utilizado para a cirurgia. No entanto, esses equipamentos diferem em alguns aspectos. A bateria, por exemplo, pode variar em tamanho e tipo (recarregável ou não-recarregável), e também quanto à sua funcionalidade e longevidade.

Da mesma maneira que para viajar de ônibus ou avião você não precisa saber exatamente todas as características técnicas destes meios de transporte, não se espera que pacientes tenham que entender em detalhes como um marca-passo cerebral funciona! No entanto, acredito que para uma viagem longa, informações básicas sobre as condições de bordo podem fazer sua experiência como passageiro definitivamente melhor. Pensando nisso, realizamos dois estudos, no King´s College Hospital, em Londres, entre 2016 e 2019.

Bateria recarregável vs. não recarregável
O objetivo do primeiro estudo foi entender fatores que levavam pacientes a escolher entre os modelos de marca-passo recarregável e não-recarregável. As baterias recarregáveis são menores e duram de 15 a 20 anos. No entanto, a desvantagem é a necessidade de ter que recarregá-las com frequência de no mínimo 2 vezes por semana e, portanto, ter que levar o carregador em viagens. No caso das baterias não-recarregáveis, o paciente não precisa se preocupar muito com a manutenção semanal após a cirurgia. No entanto, a vida útil da bateria é menor, geralmente de 3 a 6 anos, sendo necessária uma pequena cirurgia para substitui-la.

No segundo estudo, avaliamos o índice de satisfação dos pacientes após a cirurgia, quanto ao tipo de marca-passo escolhido. Juntos, esses estudos mostraram que aproximadamente 60% dos pacientes optaram pelo tipo de bateria não recarregável. No entanto, quando reavaliados após uma média de 18 meses da cirurgia, observamos que pacientes de ambos os grupos mostraram-se satisfeitos com suas escolhas.


Exemplos de sistemas para estimulação cerebral profunda atualmente disponíveis
O fato de os pacientes terem sido informados, sobre as vantagens e desvantagens básicas de cada tipo de aparelho e participado ativamente da escolha, contribuiu para uma melhor experiência e satisfação com o tratamento a longo prazo. É claro que seu médico o ajudará na escolha do sistema ideal para o seu caso, no entanto, a opinião do paciente (o maior interessado da história) conta, e muito. Isto porque cada um deve adequar a escolha de acordo com características individuais de estilo de vida e até do contexto habitacional.

Lembro-me de um paciente que optou pelo sistema não recarregável por morar em uma região muito chuvosa e com quedas frequentes de energia. Um outro, vivia em um veleiro! Ambos chegaram à conclusão de que a rotina de ter que recarregar a bateria do marca-passo seria difícil. Por outro lado, outros pacientes acabaram optando pelo sistema recarregável, por julgarem simples de fazê-lo enquanto assistiam televisão e pelo receio de uma nova cirurgia para troca da bateria em alguns anos.

Estes foram os primeiros estudos a colocarem o paciente no centro do processo de avaliação pré-operatória e de escolha do tipo de marca-passo cerebral a ser usado no tratamento de distúrbios do movimento.

O tratamento cirúrgico da Doença de Parkinson, Tremor Essencial e dos demais distúrbios do movimento deve ser realizado por equipe com experiência. Portanto, não se sinta inibido! Pergunte e tire todas as dúvidas com seu médico antes da cirurgia, pois pequenos detalhes podem fazer toda a diferença. 

Luciano Furlanetti, MD, PhD, FEBNS (CRM 121.022)